O Eleitor Religioso Brasileiro (ERB) precisa ser estudado.
Atravessou os anos 80 implorando representação política sob o slogan "o Brasil é do Senhor Jesus".
Quando conseguiu a tão sonhada representação, por essas montanhas de Minas o ERB elegeu a dupla Mário de Oliveira e Carlos Willian (todo mundo lembra no que deu), ajudou a estabelecer o clã dos "Quintão", elegeu aqueles que quase conseguiram desapropriar parte de um bairro em Belo Horizonte em prol da sede de uma franquia Batista... e por aí vai.
Brasil afora, o tristemunho dos votos do ERB segue: contribuiu para o fortalecimento da "bancada da bíblia". Viu um deputado ficha suja perder a esposa, estrela gospel, para o "amigo senador abençoado", logo após ela ter substituído o marido em Brasília, na intenção de manter a família representada no Congresso Nacional. Aplaudiu um infeliz pastor metrossexual, que dá ordem aos anjos e adora participar de programas de auditório para combater a diversidade humana sem nenhum amor. O "casal Garotinho" e Eduardo Cunha são os rótulos de si mesmos que tiveram a bênção do ERB. Sem esquecer de Hidekazu Takayama, que trocou os cansativos "congressos" pela mordomia do "Congresso"...
Chegamos em 2018 e com ele outra eleição que, desta vez, apresenta candidatos "evangélicos" disputando o cargo máximo. Mas desta vez o ERB entendeu que não pode votar nos candidatos de sua crença porque:
* a candidata não pode ser eleita por "não fazer da sua fé uma bandeira" - palavras do inFeliciano -, não se posiciona, o pensamento dela é moderninho e adequado demais e isso é coisa de crente falso. Diálogo? Nem pensar. O Jesus do ERB gosta é de virar a mesa e descer o chicote.
* o outro candidato é um cabo raiz demais - crente maluco, re-te-té, só fala em Jesus - ele ainda representa o que o ERB era nos anos 80. Agora está ultrapassado. Agora o Jesus do ERB é justiça, mas, dependendo da barganha, perdoa. Os tempos mudaram.
Mas agora, o ERB sabe em quem votar. Ele encontrou representação num candidato que parece sério, faz cara de bravo, parece meio maluco, mas que faz um discurso adequado, alinhado a todos os preconceitos que o ERB já carrega em si, com a voz empostada e com a mesma hipocrisia já tão praticada no seu meio.
Duvida? Então vai ter que acreditar na cena do candidato do ERB sendo batizado no Rio Jordão. Batismo celebrado pelo Pastor "Político" Everaldo - que só teve validade enquanto eram do mesmo partido.
O ERB não pensa no país como estado laico, fora do seu templo ou além dos poucos versículos da Bíblia que ele está acostumado a ler fora de contexto, nas reuniões comunitárias semanais.
Ele segue a cartilha do "não precisa ser, tem que parecer", que é tão bem ensinada pelos mestres Edir Macedo, R. R. Soares, Silas Malafaia, Lucinho Barreto, Samuel Ferreira, dentre outros sanguessugas do poder. São Gideões de balneário, que ignoram o fato de Jesus ter comparado esse jogo de aparências a "sepulcros bem cuidados" – obras de arte por fora e putrefação por dentro.
Para o ERB o Brasil pode até não ser tão de Jesus assim, mas Deus é brasileiro e está com o seu candidato. Não é necessário analisar outros candidatos e programas. Pra quê?
E com o tempo o ERB conseguiu criar uma mutação, o Eleitor Moralista Brasileiro, que não frequenta o templo, mas comunga dos mesmos preconceitos, dos mesmos temores e, por conveniência, alinharam as convicções e passaram a andar juntos.
É triste constatar que tendo mais de dez candidatos e alguns deles em condições de fazer um governo razoável (do jeito que está, governar com excelência é impossível, nem sendo proclamado mito), ainda nos apegamos a valores religiosos e causas morais para discutir o sexo dos anjos, enquanto ignoramos as reais necessidades de um país.
Vamos destilando nossas neuras como premissas enquanto o povo perece por falta de educação, por falta de assistência e mutilados em seus direitos por questões de raça, gênero e crença.
Enquanto nada muda, lembro da canção de Lulu Santos e vejo a humanidade caminhando com passos de formiga e sem vontade (nenhuma) de pensar.
Até quando?
(Imagem: Google)